sábado, 22 de março de 2014

O amor e outras drogas . . . a estranha viagem de Arnaldo.

um rockeiro brasileiro com visual de rockeiro... coisa rara para a época
Era uma vez um jovem que recebeu dos deuses um talento extraordinário para compor e tocar vários instrumentos com maestria.
Dos deuses também veio o bom gosto, já que esse jovem era fã dos melhores estilos musicais, do blues ao progressivo. Em plena década de 60, em um brasil que conseguia ser pior do que é hoje, ele já injetava em suas composições acordes e levadas que apenas mestres do outro lado do oceano como Yes e Pink Floyd conseguiam converter em melodia. Isso tudo aliado a algo que (infelizmente) não podia faltar na época, uma coisa meio indefinida chamada "brasilidade".
Arnaldo Baptista sempre foi um extraterrestre. Veio de algum lugar do futuro para um país execrado cheio de músicos medíocres, estilos musicais pífios e personalidades enquadradas. 
Formou os "MUTANTES" com seu irmão Sérgio (também um brilhante músico) e uma linda e talentosa cantora e flautista chamada Rita Lee (que era uma encarnação anterior desta senhora que hoje compõe marchinhas para carnaval e dotada de uma verborragia anacrônica). E essa se tornou a banda mais reconhecida do país até os dias de hoje. 
Provavelmente você ouviu falar muuuuito pouco sobre eles. Mas eles trouxeram pra cá os primeiros acordes do Rock que se espalhou pelo mundo. Guitarras pulsantes, bateria forte e teclado psicodélico. Ainda hoje uma legião de fãs cultua os Mutantes mundo afora - incluindo grandes personalidades do mundo musical. O falecido Kurt Cobain apaixonou-se por Mutantes, Arnaldo e seus trabalhos posteriores (como Patrulha do Espaço e etc.). Tentou desesperadamente contato pessoal com ele quando esteve no brasil, sem sucesso.
Mas... no meio da brilhante estrada desse brilhante artista havia dois grandes vícios: o LSD, e o amor.
Arnaldo caiu de amores, e acabou casando com Rita. Foi um belo romance, cheio de excelentes criações, farto material para a imprensa e os porraloucas da época.
essa era a Rita pela qual Arnaldo se apaixonou... numa dimensão paralela...
O LSD trouxe grande parte da loucura criativa de Arnaldo, mas levou muito de sua destreza musical. Talvez seu caminho fosse se tornar um Syd Barrett brasileiro, quem sabe, não tivesse antes sido atropelado pela tragédia maior: o rompimento com Rita, seu primeiro, único e absoluto amor.
As minúcias da separação são obscuras. Ela nunca topou contar os motivos, nem ele. Mas a consequência foi a viagem de Arnaldo para outra dimensão, outro mundo, outro planeta. Fechou-se em um mundo silencioso de tristeza, amargura e viagens alucinógenas. Rita acabou internando Arnaldo em um hospício. Outras internações se seguiram, até que num certo dia de reveillon, ele se jogou da janela do sexto andar do hospital. 
Arnaldo não morreu. Pelo menos não mais do que já lhe tinha matado o coração estilhaçado.
Recuperou-se parcialmente. Sua mente maravilhosa continuou funcionando, mas dentro de um corpo encarquilhado, que se movia aos tropeços e falava com dificuldade.
Aos poucos foi sendo "trazido de volta" ao mundo "normal". Casou-se novamente, e sua esposa dedicou sua vida a cuidar e curar quem habitava aquela casca. Arnaldo ressurgiu. Voltou a tocar, compor, chegou a fazer shows, não exatamente superando, mas convivendo com suas limitações. O que nunca mudou nele foi sua imensa criatividade, sua genialidade, seu inconformismo com o mundo em que vivia, já que em sua cabeça havia um mundo tão melhor.
é, amigos...o tempo e a vida são cruéis...
Este artigo não exalta o Arnaldo "Rockeiro", embora sua veia pesada esteja lá o tempo todo. Basta ouvir seus álbuns, tanto com bandas quanto solos. Viemos aqui apenas relembrar um pouco do Arnaldo que carrega a essência do verdadeiro "conservado": o inconformismo, a criatividade, a coragem de ser quem você é, mesmo que o mundo à sua volta é que pareça estar em outra vibração.
A música "balada do louco" coloca as coisas com toda clareza. "Mais louco é quem me diz e não é feliz."
Este é o mundo em que vivemos. Loucura e normalidade são ditadas, impostas. Criatividade, genialidade e inconformismo só são aceitos se enquadrados nos conceitos da sociedade. Senão são tratados com tarja preta e relegados a um grande hospício chamado "mundo normal".
Tente assistir ao documentário "Loki: Arnaldo Baptista". É o "The Wall" brasileiro. Os menos "caretas" (na linguagem dele) vão se identificar, e se emocionar com os percalços na vida de um grande artista que virou vítima da maldição humana: drogas que não trazem respostas, amores que não são eternos, olhares e críticas que acabam lhe convencendo de que o errado é, e sempre será, o que se destaca, o que brilha.
A quem interessar possa, Arnaldo continua vivo e sua mente ativa. Vai relançar toda sua obra, além de um novo álbum onde fala um pouco do planeta em que vive: vegetarianismo, mundos exteriores, seres de luz, tudo também retratado em suas pinturas, num estilo que chama de "exorrealista". 

Uma longa e criativa vida ao Arnaldo e a todos os "insanos" que insistem em viver fora deste planetinha horrível, sem fazer mal a ninguém...

lembrança de quando fomos felizes...



música para reflexão: Toda a obra de Arnaldo Baptista.

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