Nosso país é pródigo num bocado de coisas. Mas, se tem algo que foi muito mal formado no Brasil, com certeza foi a Cultura CERVEJEIRA! Alguns motivos podem até explicar esse fato, como a demora que a bebida sofreu para chegar ao Brasil, já que os colonizadores portugas morriam de medo de perder o mercado de vinhos... mas, por sorte, o rei Dom João (aquele) era fã do suco de cevada, e aos poucos a cerveja foi chegando pelos portos brasileiros.
Nas primeiras décadas de 1800, consumia-se no Brasil mais cachaça, licores franceses e, é claro, vinhos portugueses. As primeiras cervejas feitas por aqui eram rudimentarmente artesanais, feitas nas casas dos imigrantes: uma mistura estranha, feita de água, milho, e coisas como casca de limão, açúcar mascavo e gengibre. Daí um de seus primeiros nomes: gengibirra.
Divertida mesmo foi a "cerveja marca barbante" (nominho genérico para as primeiras engarrafadas que foram colocadas à venda). E por que o nome? O processo de fabricação era tão tosco, que a bebida adquiria um grau de fermentação fortíssimo, produzindo um monte de gás carbônico, e pipocando qualquer rolha com que se tentasse fechar a garrafa! Solução à brasileira: amarrar a rolha no gargalo com um barbante! Sim, amigos, uma versão MacGyveriana que virou sinônimo de improviso para sempre.
O que vinha de fora não era de se desprezar: cervejas inglesas. Mas o país recebia o restolho do restolho, um líquido grosso, sujo, envasado em barris, em viagens infindáveis de navio de um continente ao outro. Até que, mais no final do século, eles - os alemães - entram no mercado com uma cerveja mais clara, límpida, e... engarrafada! Finalmente havia uma certa concorrência de mercado - mas nesse ponto a Europa já produzia centenas de tipos de cerveja há décadas e décadas... pense no nosso atraso!
Bem, esse é um resuminho bem xongas de toda a história. Mas, se tem algo que se pode afirmar, é que ninguém sabe com certeza qual foi a primeira cerveja legitimamente brasileira, muito menos a cervejaria. Entretanto, os estrangeiros descobriram que o nativo gostava de uma bebida mais clara, fraca, fresca e - por que não, adocicada. E esse gosto varou os anos, solidificando-se na cultura gastronômica do país até os dias de hoje.
Se você vai num churrasco, numa festa, e servem bebida abaixo de extremamente gelada, você logo reclama? Expressões como "do fundo do freezer", "do cu da foca", "aquela lá de trás", são sempre ouvidas pelos botecos para que o desavisado garçom não traga uma cerveja que esteja "apenas" trincando?
Pois é... aí chega-se em um distante vilarejo bretão e pede-se uma... o que? É, porque se você pedir "uma cerveja", o das bochechas vermelhas vai ficar te olhando com cara de conífera: "QUAL" cerveja, meu senhor?... ou, no mínimo, "QUE TIPO" de cerveja? Aí então só algumas palavras florescem na sua sedenta mente: "Brahma?"..."Antarctica?"..."gelada?"... "a que tiver, meu tio?" Shit, I'm in trouble...!!
Sim... nos principais países cervejeiros, a variedade de marcas e tipos beira o absurdo. Vários tons de cor, paladar, graduação alcoólica, densidade, cremosidade, e... consequentemente, a TEMPERATURA em que se serve o néctar. Em breve vamos abordar mais dessas minúcias (afinal, o livro vem aí...), mas sem besteirol técnico ou palavreado de químico - é pra dar uma idéia do que você pode esperar de cada uma.
Voltando às plagas brasilianas, podemos afirmar que a DEGUSTAÇÃO de cerveja é raríssima. Felizmente, cresce a cada dia, mas como um fenômeno de rebote tardio, trazido geralmente por gente que provou das "gringas" no estrangeiro, caiu de amores, e agora não consegue mais molhar o beiço numa dessas poucas que dominam o mercado nacional. Ainda felizmente, cresce muito no Brasil a fabricação artesanal, além das microcervejarias, trazendo variedade, criatividade e conhecimento a um público carente de "sabedoria".
Bem, a grande maioria dos "bebedores", é claro, vai continuar alegremente como "cervejeiro de churrasco": o boi queimando no espeto, as mulé dançando um pagode, e o barrigudo de bermuda, havaiana e camisa do Framengu gritando lá da beira da piscina cheia de criança, lata vazia e mijo: "Aê, sangue bão, pega uma aí do cu da foca!!" E lá vem mais uma infeliz latinha, quase congelada, trazendo um resquício de um sabor que originalmente já era um resquício de uma cerveja de verdade...
Mas essa história não acaba aqui...
PROSIT!
música para reflexão: "I wish you were a beer", do Cycle Sluts from Hell.
5 comentários:
Errr me identifiquei com o cervejeiro de churrasco ali ( e nem carne eu como rs), mas de fato: não manjo do assunto.Pra mim cerveja ainda é Skol, Brahma, e na melhor das hipóteses Heineken e Devassa. Tô gostando de aprender. Ansiosa pela "parte 2"
Até =*
Fabrizia...
Liga naum - você não está sozinha na preferência! De fato, a "loira geladíssima" é parte da nossa cultura. Mas, "say tuned" para as dicas futuras e depois avalie, teste, compare... tem muita "birra" por aí que merece ser conhecida e degustada!
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Oi,gostei taaanto desse post,continue divindindo estes seus conhecimento cervejeiros aqui, please. Fiquei curiosa com a questão da temperatura, porque algumas vezes, bebendo cervejas mais ecorpadas, vi pessoas reclamando de não estar tão gelada, mas eu comentei que aquela cerveja eu tinha achado melhor servida daquela forma e isso é sempre um assunto que divide opiniões. Eu não sou nenhuma entendida de cerveja, mas tenho curiosidade e aprecio, então, espero aprender muito mais aqui rs. Vou aguardar os próximos posts!
PS:descrição do inferno no último parágrafo,viu!
Erika...
Que bom que você gostou. Mas realmente é muito diversificado o reino da gloriosa cerva! E, fora as "manhas" todas, obviamente entra o gosto pessoal. Por isso a gente vai ver alguns detalhes bem engraçados (até extravagantes...) nos próximos posts.
Longa vida às mulheres apreciadoras da cerveja!
Até a próxima!
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Não gosto desse gosto das cervejas normais, mas não encontro outras que prestam.
Qual a sua recomendação para beber aqui no brasil?
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